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O BRASIL DIANTE DA ASCENSÃO DO NAZISMO: RESISTÊNCIA E NORMALIZAÇÃO

Quando houve a ascensão do partido nazista na Alemanha, o Brasil também vivia um período de autoritarismo, sob o governo de Getúlio Vargas. Vários integrantes do regime varguista nutriam simpatias pelos movimentos de extrema-direita europeus, sobretudo o fascismo italiano – e diversas políticas internas foram baseadas neste.

No entanto, em diversos aspectos, o regime varguista se caracterizava pela ambiguidade e o esforço de tentar conciliar interesses muito diversos. Assim, por exemplo, restringiu a imigração judaica para o Brasil, mas ao mesmo tempo criou poucos entraves para os judeus que já viviam no país. Na arena internacional, essa ambiguidade também se manifestava, com o governo procurando aproximações, simultaneamente, com a Alemanha e os EUA – até a neutralidade se tornar insustentável e o Brasil declarar guerra ao Eixo, em 1942.

Para além das políticas oficiais, setores da sociedade brasileira se posicionavam sobre as movimentações políticas na Europa, até antes de 1933. Entre 1928 e 1938, operava no país uma seção do partido nazista, exclusiva para alemães emigrados e que contava com 2900 integrantes. Era então considerada a maior seção do partido fora da Alemanha, embora seja importante notar que só 4% dos cidadãos alemães residentes no Brasil se filiaram.

Com bem mais expressão, havia também a Ação Integralista Brasileira (AIB), movimento nacionalista inspirado no fascismo italiano, mas com diversos membros simpatizantes do nazismo, como Gustavo Barroso. Por outro lado, setores antifascistas também se organizaram, com destaque para a criação da Frente Única Antifascista, em 1933.

Jornal “Diário da Tarde”. Curitiba, Brasil, 31 de janeiro de 1933.

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Essa página de jornal data do dia seguinte à nomeação de Adolf Hitler como chanceler da Alemanha. O “Diário da Tarde” circulou em Curitiba entre o fim do século XIX e a maior parte do século XX.

Nos primeiros anos da década de 1930, a crise política alemã aparecia com relativa frequência nos jornais brasileiros. Nesse momento, a imagem de Hitler e dos nazistas era fundamentalmente negativa. Eles eram retratados como racistas, belicistas, incultos e próximos ao fascismo italiano. Sua derrota nas eleições presidenciais de 1932 foi tratada, em geral, inclusive no “Diário da Tarde”, como uma boa notícia.

Porém, a nomeação de Hitler como chanceler, em janeiro de 1933, foi vista como um sinal de maior estabilidade por ter formado uma coalização de governo mais sólida do que seus antecessores. O “Diário da Tarde”, bem como outros veículos, adotou a narrativa de que os partidos conservadores que se aliaram a Hitler poderiam controlá-lo. Com o tempo, a abordagem mudaria. Porém, com sua ascensão, o partido nazista foi normalizado como mais um agente, e até estabilizador, da política alemã.

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Livro “Minha Luta”. Brasil, 1934.

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Em 1933, quando Adolf Hitler foi nomeado chanceler da Alemanha, o interesse no Brasil por esse personagem cresceu. Em 1934, a Livraria do Globo, sediada em Porto Alegre, decidiu adquirir os direitos de publicação no Brasil do livro Mein Kampf, de Hitler, sob o título “Minha Luta”. Essa casa editorial publicava obras de teores ideológicos diversos, mas viu em “Minha Luta” uma oportunidade comercial. Por isso, inclusive aceitou as condições impostas pela editora alemã de que tanto o editor quanto o tradutor não fossem judeus.

A recepção do livro foi ambígua. Por um lado, foi apresentado como uma oportunidade de o leitor brasileiro melhor entender um político que causava fascínio e era tido como um dos grandes líderes mundiais. Outras resenhas já denunciavam o autoritarismo e racismo que permeavam a obra. 

Essa recepção e o fato de ser publicado por uma editora respeitada apontam que, nesse primeiro momento, Hitler e seu livro foram vistos no Brasil como controversos, mas parte do jogo político. “Minha Luta” teria sete edições brasileiras até ser proibido e ter sua tiragem recolhida após a declaração de guerra do Brasil à Alemanha, em 1942.

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Livreto “Em Legítima Defesa”. Curitiba, Brasil, 1937.

Este livreto foi escrito por Bernardo Schulman, judeu nascido na Rússia em 1885 e que em 1909 imigrara para a região de Curitiba, onde viveu até falecer em 1971.

Ele é uma resposta direta à publicação, em 1936, da tradução brasileira de “Os Protocolos dos Sábios de Sião” por parte de Gustavo Barroso, intelectual brasileiro e militante da Ação Integralista Brasileira, organização de extrema-direita inspirada no fascismo italiano. “Os Protocolos” é um livro apócrifo surgido na virada do século que atribuía aos judeus uma conspiração para dominar o mundo. Embora anos antes já tivesse sido desmascarado como fraude e plágio grosseiro de outra obra, continuou circulando, especialmente à medida que o partido nazista se fortalecia.

“Em Legítima Defesa” se constituiu não apenas como resposta à Barroso, mas em um manifesto contra o crescente antissemitismo que se alastrava na Europa e reverberava no Brasil. Alguns dos expoentes eram a própria Ação Integralista Brasileira, criada em 1932, e a filial do partido nazista no Brasil, que funcionava entre imigrantes alemães desde 1928.